Onde termina um dia comum
Há cerca de um mês, presenciei uma cena que ainda me visita em silêncio.
Um ambulante foi atropelado no centro da cidade. Quando passei por ali, ele já estava estirado no chão, imóvel. A vida havia sido interrompida de forma abrupta, quase banal, como se alguém tivesse fechado um livro no meio de uma frase.
Imagino que, naquela manhã, ele tenha tomado café. Talvez tenha se despedido da família com um “até logo”, ou desejado um bom dia a algum conhecido. Pode até ter feito planos. E então, no meio da rotina comum, sua história foi cortada.
O que me deixou inquieto não foi apenas o acidente em si, mas o que veio depois. No dia seguinte, tudo estava limpo. A rua seguia viva, os passos continuavam, o comércio abria suas portas, os carros buzinavam como sempre. Talvez alguém tenha comentado: “aqui morreu um homem ontem”. Mas, no geral, a vida seguiu como se nada tivesse acontecido.
E isso me faz pensar no tamanho da nossa presença neste mundo. No quanto somos, ao mesmo tempo, importantes e descartáveis. A gente corre, trabalha, sonha, ama, se preocupa e em um dia qualquer, nós simplesmente, saímos de cena. Às vezes sem aviso, sem adeus, sem plateia.
O esquecimento é, quase sempre, o desfecho mais provável.
E então me pergunto: quem somos, de fato? Quem sentirá nossa falta? Por quanto tempo? O que deixamos? O que importa, mesmo?
Não tenho respostas. Mas aquela cena ficou. Não apenas pelo que aconteceu com ele, mas pelo que despertou em mim.
Talvez escrever seja a minha forma de lembrar. Ou, quem sabe, de resistir ao esquecimento.
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